quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Cibercultura e Cultura da Convergência: por uma cultura participativa!?


Analisando a configuração atual da nossa sociedade, é inevitável não questionar sobre as relações e influências diretas e indiretas das tecnologias digitais nas vidas de todos nos, sobre o nosso posicionamento e as nossas condições frente a esta conjuntura social, denominado por alguns estudiosos de “Cibercultura”, ou seja, frente a um conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores, que se desenvolvem juntamente com o crescimento das tecnologias digitais de informação e comunicação, mas principalmente pelo acesso e expansão da internet (LEVY, 1999).
Dispositivos e inúmeros softwares e aplicativos das tecnologias digitais de informação e comunicação, em especial a partir da WEB 2.0, vêm influenciando e determinando (re)configurações no âmbito social e cultural.
A sociedade da informação é uma realidade mundial. A Internet já é uma realidade mundial, interligando todos os países do planeta, os telefones celulares estão em franca expansão, os serviços de governo eletrônico são implementados ao redor do mundo, comunidades e redes sociais nascem com as ferramentas sociais da Web 2.0, formas de ativismo político e protestos emergem utilizando as tecnologias e redes informacionais como suporte... O mundo da cibercultura está longe de ser uma utopia, e o futuro aponta para o desafio de uma ciberdemocracia global. (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 23)
Ainda que grande parte da população não se encontre contemplada com acesso direto e significativo aos avanços tecnológicos, nos encontramos inseridos na “Cultura Digital”, e a elaboração de dispositivos equitativos comprometidos com a inclusão digital da população deve representar um aspecto chave nas políticas voltadas para o conhecimento crítico e o acesso qualitativo às tecnologias digitais.
Lemos e Lévy (2010) ponderam sobre a atual condição ou situação da sociedade a partir do uso e avanços da internet, assim como suas implicações diante dos recursos e movimentos proporcionados com a Web 2.0. Entendem que a computação social aumenta as possibilidades da Inteligência Coletiva, que apontam para uma sociedade mais livre e democrática. No entanto, isto implica em ações voltadas para a ampliação do acesso à população aos dispositivos e recursos que resultaria em uma possível “evolução cultural”.
De acordo com Castells (2000) vivemos em um mundo digital. As transformações tecnológicas estão se expandindo pela capacidade de criar interfaces a partir de linguagens digitais. Para esse autor, o desenvolvimento científico e tecnológico é elemento fundamental para o nosso progresso.
Diante desse cenário, acreditamos que a evolução contemporânea do acesso às tecnologias, da liberdade de expressão no ciberespaço e das diversas ferramentas interativas, participativas e colaborativas da Web, representa ou pode representar profundas possibilidades para o efetivo desenvolvimento de uma sociedade mais crítica, democrática e equitativa.
Para isso, é fundamental que tenhamos a compreensão das mudanças que vivenciamos com a reconfiguração na esfera comunicacional para que possamos perceber a irreversível necessidade de termos todos os membros da sociedade inseridos nessa dinâmica.
O entendimento dos aspectos relacionados à cibercultura, dos princípios que norteiam a contemporaneidade com a apropriação das tecnologias digitais, pode representar um caminho promissor nas mudanças que estão ocorrendo e que deverão continuar nos próximos anos. Para além de um conhecimento puramente técnico, operacional, a consciência acerca dos fundamentos dessa cultura digital é que poderá proporcionar uma transformação social voltada para uma participação efetiva e qualitativa de todos.
A cibercultura tem como princípios a “liberação da palavra”, “a conexão e a conversação mundial” e “a reconfiguração social, cultural e política”. Está voltada para um processo de emancipação social, em direção a uma democracia planetária (LEMOS; LÉVY, 2010).
A liberação da palavra seria a diversificação das vozes a partir da conexão em rede, a liberdade de expressão e a livre comunicação permitindo a troca de informação entre pessoas e comunidades, o que resulta na “liberação da emissão”.
A transformação da esfera midiática pela liberação da palavra se dá com o surgimento de funções comunicativas pós-massivas que permitem a qualquer pessoa, e não apenas empresas de comunicação, consumir, produzir e distribuir informação sob qualquer formato em tempo real e para qualquer lugar do mundo. (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 25)
O princípio da conexão e da conversação mundial, denominado por Lévy (1999) de “inteligência coletiva”, emerge a partir da liberação da palavra. Esse princípio criaria uma “interconexão planetária”, resultando em manifestações coletivas ao mesmo tempo local e global.
A partir dessas mudanças, temos a reconfiguração das estruturas sociais, com uma maior participação das pessoas no acesso, na produção e distribuição de conteúdos, assim como nos processos comunicacionais (LEMOS, 2003). Não se trata de substituição, mas de uma transformação com formas diversificadas de acesso e uso dos dispositivos e recursos disponíveis com as tecnologias digitais.
Há, portanto, uma reconfiguração do sistema infocomunicacional global, onde, pela primeira vez, aparecem dos sistemas em retroalimentação e conflito: os sistemas infocomunicacionais massivo e pós-massivo. Na estrutura massiva do controle de emissão – a industria cultural clássica – a informação flui de um polo controlado para as massas (os receptores). Com o surgimento e expansão do ciberespaço, esse modelo está sendo tensionado pela emergência de função pós-massiva. Aqui a liberação da emissão não é apenas liberar a palavra no sentido de uma produção individual, mas colocar em marcha uma produção que se estabelece como circulação e conversação. (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 26)
Os três princípios da cibercultura contribuem com pensamentos e atitudes em um formato colaborativo, plural e aberto. A produção, distribuição e compartilhamento de informações de forma ampla e consistente permitirá o desenvolvimento de uma sociedade mais inteligente e politicamente consciente. Conforme afirma Lemos (2003), podemos aproveitar a potência que essas tecnologias nos oferecem para produzir conteúdo, para compartilhar informação, o que permitiria enriquecer a cultura e modificar o fazer político, principalmente em países como o Brasil.
O objetivo é utilizar o potencial das ferramentas comunicacionais digitais para expressão livre dos movimentos sociais e das articulações e reivindicações político-ativistas. O que está em jogo é o alcance planetário para questões locais; a livre expressão para publicação de informações; a colaboração e participação; a inclusão digital. (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 28)
            Ou seja, a inclusão digital é um pressuposto e um ação de relevância fundamental para as conquistas e perspectivas que se apresentam a partir desse cenário da cibercultura, de conhecimento, participação e envolvimento coletivo da sociedade nas transformações políticas, culturais e sociais. O desenvolvimento efetivo de uma cultura voltada para a participação (cultura participativa).

Este contexto e os pressupostos apontados por Lemos a partir da Cibercultura estão diretamente relacionados com a Cultura da Convergência desenvolvida por Jenkins. “Convergência, de acordo com Jenkins, ocorre ´dentro dos cérebros´ dos consumidores e ´através de suas interações sociais com os outros´.  Assim como os fluxos de informação através de diferentes canais de mídia, para fazer nossas vidas, trabalho, fantasias, relacionamentos, e assim por diante.” (NAVARRO. 2010)

A atual concepção de convergência para Jenkins não é simplesmente tecnológica, mas essencialmente cultural, que vem promovendo impactos e grandes mudanças (ou necessidades de mudanças) na estética, no conhecimento e na educação, na política e na economia. A cultura de convergência para além de consolidar o poder dos produtores de mídia, permite uma maior participação e envolvimento dos “consumidores”, que cada vez mais ampliam as capacidades de autonomia e conhecimento, exigindo novas posturas dos produtores.

Os consumidores de conteúdos de mídia, de acordo com Jenkins, são agentes criativos que ajudam a definir a forma como os conteúdos de mídia são utilizados. A Convergência de mídias, por permitir maior acesso à cultura em geral, ampliou a possibilidade de participação das pessoas, no entanto, o acesso às tecnologias ainda é desigual.

Jenkins demonstra grade preocupação com a desigualdade no acesso à tecnologia, assim como a desigualdade nas formas de apropriação e utilização dos recursos e dispositivos tecnológicos, o que resulta na exclusão da cultura de participação. Por outro lado, se mostra entusiasmado com o potencial para diversificar o conteúdo da nossa cultura e democratizar o acesso aos meios de comunicação. O que pode representar uma expansão significativa do potencial criativo da nossa sociedade.

Para Jenkins, toda nova tecnologia abre ricas possibilidades para a comunicação humana e para a expansão de formas significativas das nossas capacidades cognitivas. Mas também implica em perdas de algumas técnicas que até então são valorosas e amplamente utilizadas. O autor afirma que os avanços das tecnologias digitais irão promover uma drástica expansão da nossa capacidade de criar, de aprender e de se organizar. A questão que teremos que enfrentar é como equilibrar (conciliar) as novas habilidades com as virtudes e práticas importantes de outros tempos.

A inteligência coletiva, segundo Jenkins, pode representar uma maneira de avançar sobre a necessidade contemporânea de termos uma cultura de experiências diversificadas e de múltiplas formas de conhecimento, pois é impossível para alguém conseguir assimilar e saber sobre tudo diante do excesso de informações das novas mídias. É fundamental que nossos estudantes tenham uma formação voltada para o pensamento crítico, que possa aprimorar mecanismos que permitam selecionar o que de fato é relevante e trabalhar coletivamente, de aprender uns com os outros. Somente coletivamente será possível lidar com problemas complexos que vão muito além das competências individuais.

Referências
CASTELLS, M. A era da informação: economia, sociedade e cultura. In: A Sociedade em rede. São Paulo :  Paz e Terra, 2000.  v. 1
LEMOS, A. Cibercultura: alguns pontos para compreender a época.  In LEMOS, A. & CUNHA, P. (orgs), Olhares sobre a cibercultura. Porto Alegre: Sulina, 2003.
LEMOS, A.; LÉVY, P. O futuro da internet: em direção a uma ciberdemocracia. São Paulo: Paulus, 2010.
LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.
NAVARRO, V. Sites of Convergence: An Interview for Brazillian Academics. 2010 - Disponível em <http://br-mg5.mail.yahoo.com/neo/launch?.rand=eff36oe1nm53p#mail>  acesso em 01 de fevereiro de 2013.
JENKINS, H. Welcome to Convergence Culture. 2006 – Disponível em <http://henryjenkins.org/2006/06/welcome_to_convergence_culture.html> - acesso em 31 de janeiro de 2013.